O planejamento tributário é um mecanismo válido e eficaz utilizado por pessoas físicas e jurídicas que buscam realizar um estudo detalhado para, de forma lícita, obter economia de tributos, através da escolha do melhor regime de tributação ou reorganização patrimonial e societária.

É de conhecimento geral que na seara privada vige o princípio da legalidade e da autonomia da vontade de que tudo o que não estiver expressamente proibido por lei é permitido, significando dizer que, no campo do planejamento tributário, se não há restrição legal o contribuinte está autorizado a fazer.

Por outro lado, é natural da própria atividade empresarial que o gestor privado busque, no exercício de sua atividade, promover economia com impostos e despesas e, em existindo maneiras legais de fazê-la, opte pela que lhe seja mais benéfica.

Entretanto, esse não parece ser o entendimento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, que vem desconsiderando operações de planejamento tributário sob a justificativa de inexistência de proposito negocial e de desrespeito ao princípio da função social da empresa, considerando o planejamento tributário que possua finalidade preponderante de obter reduções fiscais um abuso de direito que deve ser coibido.

Para o CARF o propósito negocial tem relação com a atividade econômica desenvolvida pela empresa no cumprimento de seu objeto social, devendo um planejamento tributário ter um motivo extratributário, ou seja, que não seja apenas e tão somente o de reduzir a carga tributária.

Cito como exemplo o caso de empresa que possuía em seu patrimônio permanente alguns imóveis e promoveu uma cisão para criação de uma patrimonial (transferindo para essa todo o patrimônio imobiliário da empresa cindida) com a finalidade de promover a compra e venda de imóveis e gerir patrimônio próprio. Após a patrimonial ter sido criada, foi realizada a venda de vários de seus imóveis e o lucro foi distribuído aos seus sócios, gerando uma economia substancial de impostos quando comparado com a situação de a venda ser feita pela empresa cindida. O CARF desconsiderou a cisão entendendo que os imóveis foram comercializados e deveriam ter sido tributado o ganho de Capital da empresa que os possuía antes da cisão.

A autuação foi feita e mantida pelo CARF com a aplicação de multa qualificada de 150% por simulação, inclusive, mesmo diante da ausência de provas de que os imóveis teriam sido prometidos à venda antes da criação da patrimonial, desconsiderando que o objeto social de uma patrimonial é justamente a compra e venda e gestão de imóveis próprios, inexistindo qualquer simulação nesse caso.

Justificou-se pela desconsideração da cisão, dentre outros argumentos, pelo entendeminento de que a patrimonial teria sido criada com o fim específico de economia fiscal e que a patrimonial sequer possuía sede própria. Indaga-se: onde existe vedação específica de economia fiscal? Não existe!!

Tal entendimento gera uma insegurança jurídica sem precedentes em nosso ordenamento, fragilizando ainda mais nossa tão sofrível economia e a necessária estabilidade do setor empresário, já tão frágil. Nas relações entre Fisco e Contribuinte a transparência e previsibilidade deve imperar, não podendo se admitir que o contribuinte fique a mercê das interpretações subjetivas dos auditores fiscais.

Vale notar que o próprio sistema tributário brasileiro estimula as empresas e prestadores de serviço a buscar o regime tributário mais benéfico pra sua atividade, podendo escolher entre SIMPLES NACIONAL, Lucro Real e Lucro Presumido, por exemplo. Ou no caso da criação de EIRELI por pessoas físicas e a criação da figura do Microempreendedor Individual – todas essas opções trazem benefícios e reduções na carga tributária.

De fato, a simulação, fraude, e a sonegação devem ser severamente combatidas, entretanto, uma vez constatada a inexistência de impeditivo legal e, diante de dois caminhos lícitos, o contribuinte tem o direito de optar pelo menos oneroso, não havendo que se falar em abuso de direito. Não existe norma em nosso ordenamento jurídico que estabeleça como condição de validade do planejamento tributário a motivação extratributária, razão pela qual, em nome da segurança jurídica e da proteção do jurisdicionado contra o poder estatal, não pode ser exigido o propósito negocial ou motivação extrafiscal para validar um planejamento tributário.

Por fim, na briga entre o propósito negocial da empresa e a segurança jurídica, a Constituição Federal dá prevalência à segurança jurídica, já que o propósito negocial não passa de uma criação de parte da doutrina com nítido viés fazendário. Enquanto o regime econômico brasileiro for o Capitalismo, será lícito aos empresários priorizarem os lucros, buscando a economia de impostos e despesas de forma legal.

Roberta Maia Broder, advogada tributarista, sócia do Nogueira Reis Advogados, especialista em negociação pelo Program on Negotiation da Harvard Law school e Mestranda em Direito Tributário Profissional pela FGV. @robertabroder