O tema jurídico mais comentado entre empresários, advogados e contadores no ano de 2020, para além das medidas extraordinárias decorrentes da COVID-19, sem dúvida é a Reforma Tributária.

Todos sabem da importância e urgência de se rever o sistema tributário vigente no País, e o que mais importa nesse momento é de fato a sua simplificação. A expectativa de redução de carga tributária parece mais um sonho distante e de difícil concretização.

O Relatório Doing Business do Banco Mundial, divulgado em 23/10/2019, apontou que o Brasil é o País onde se gasta mais tempo com burocracias tributárias no mundo. As empresas brasileiras gastam mais de 1.500 horas por ano apenas para cumprir as obrigações acessórias e realizar os pagamentos dos tributos.

Analisando o sistema tributário complexo e burocrático de nosso País, o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) em estudos recentes constatou que desde a Constituição Federal de 1988 foram criadas 419.837 normas tributárias e em 32 anos tivemos 16 Emendas Constitucionais em matéria tributária, tendo sido criados diversos tributos e praticamente todos eles foram majorados.

Todos esses dados demonstram a forte insegurança jurídica em que vivemos e que acaba por afastar investidores internacionais, além de desencorajar o empreendedorismo no País.

Com base nesse cenário, que se perpetua e castiga os contribuintes brasileiros há muitas décadas, o Legislativo e o Executivo ensaiam uma Reforma Tributária. Atualmente, encontram-se em trâmite no Senado Federal e na Câmara dos Deputados duas Propostas de Emenda à Constituição Federal: A PEC nº 110/2019 e a PEC nº 45/2020, sendo que ambas estão paradas, a primeira desde 02/12/2019 e a segunda desde 08/10/2019.

Mais recentemente, o Poder Executivo, através do Ministro da Economia Paulo Guedes, apresentou o Projeto de Lei nº 3.887/2020 e, ao que parece, este passou na frente das citadas Propostas de Emenda Constitucional, devendo prevalecer.

Fato é que quando comparado aos Projetos de Emenda à Constituição nº 110/2019 e nº 45/2019, o Projeto de Lei nº 3887/2020 mostra-se a mais tímida das propostas.

Explica-se: A Proposta de Emenda Constitucional nº 110/2019, em trâmite no Senado Federal, parada desde 02/12/2019, propõe a criação do “IBS” em substituição a 9 tributos, quais sejam o IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, CIDE-Combustíveis, Salário-Educação, ICMS, ISS, ao passo que a PEC nº 45/2020 prevê a criação do “IBS” em substituição a 5 tributos, o IPI, PIS, COFINS, ICMS e ISS.

Já o Projeto de Lei nº 3.887/2020, apresentado pelo Ministro Paulo Guedes em julho deste ano, propõe a substituição apenas do PIS e da COFINS pela Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços – CBS. Tal substituição na prática em nada simplifica o sistema tributário, já que o PIS e a COFINS, apesar de serem contribuições sociais distintas, sempre foram tratadas como um único tributo por terem exatamente a mesma base de cálculo, fatos geradores, sujeitos passivos e sistema de arrecadação.

Se por um lado a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços substitui apenas 2 tributos, que já eram considerados “gêmeos siameses” – PIS E COFINS, por outro o Projeto de Lei resolve questão há muito controvertida e que abarrota o Judiciário (exclusão de ICMS e ISS da base de cálculo do PIS e da COFINS), ao definir, em seu artigo 7º, a não incidência do CBS sobre ICMS, ISS e sobre a própria CBS.

Entretanto, não se trata aqui de uma benevolência proposta pelo Poder Executivo, pois na prática significa uma mera aquiescência ao quanto definido pelo STF em sede de Repercussão Geral através do RExt. 574.706 (ICMS) e do RExt. 592.616 (ISS), estando esse último ainda pendente de conclusão do julgamento.

Segundo a proposta de Lei nº 3.887/2020, a “CBS” será não cumulativa, podendo o contribuinte se creditar integralmente da CBS efetivamente paga na aquisição de mercadorias e serviços. Entretanto, a alíquota geral da CBS, de acordo com o PL, será de 12%, o que representa um aumento quando comparada à soma das alíquotas de PIS e COFINS não cumulativo atualmente vigente (9,25%).

A majoração da carga tributária é ainda mais evidente no caso dos contribuintes optantes pelo lucro presumido que realizam o pagamento do PIS e CONFINS pelo regime cumulativo, que hoje suportam a alíquota de 3,65% e passarão a se submeter ao pagamento de CBS na alíquota de 12%. Para os prestadores de serviços com poucos ou quase nenhum insumo, essa mudança representará um aumento brutal e sem precedentes e por isso merece a devida atenção da categoria.

A Reforma Tributária, nos moldes propostos pelo PL nº 3.887/2020, ainda é muito tímida, sendo nomeada pelo próprio Poder Executivo como o “primeiro passo” para a Reforma Tributária. De fato, a reforma proposta pela PEC nº 110/2019 mostra-se muito mais abrangente e poderia representar uma efetiva simplificação do Sistema Tributário vigente, mas diante da burocracia e resistência política enfrentada no próprio Congresso Nacional, parece impossível sua aprovação em um curto prazo de tempo.

Sem dúvidas as reformas que até agora vêm sendo propostas podem até ser consideradas um “primeiro passo”, mas por hora o que se vê e se conclui é que está sendo produzido muito barulho para pouca ação, e por isso devemos seguir atentos nos próximos passos legislativos de forma a evitarmos surpresas negativas.

Roberta de Almeida Maia Broder, Advogada Tributarista, sócia do Nogueira Reis Advogados, especializada em Negociação e Resolução de Conflitos pelo Program on Negotiation da Harvard Law School.