O quanto soa estranho falarmos em cobrança de IPTU sobre propriedades com finalidades rurais? Apesar de espantoso, por vezes nos deparamos com proprietários de áreas com finalidade (claramente) rural que acabam pagando  Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU).

Com o crescimento desenfreado populacional, as cidades acabam engolindo territórios que outrora eram considerados como zona rural dos municípios e, assim, diversas propriedades rurais passam a estar localizadas em zonas urbanas. E é nesse cenário que surge a questão: qual imposto deve ser pago/cobrado sobre essas áreas, o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) ou Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU)?

A resposta para esta pergunta parece lógica, mas, como sempre, o ente fiscal adotará o entendimento que lhe for mais favorável. O IPTU, tributo cobrado pelo município, cuja base de cálculo é o valor venal do imóvel, estabelecido pelo Poder Público para a propriedade, costuma ser bem mais caro que o ITR, tributo federal cobrado anualmente, com alíquotas que variam de 0,03% a 20% em função da área do imóvel e do grau de sua utilização ou produtividade. Muitos proprietários de imóveis com finalidade exclusiva rural localizados em zonas urbanas acabam sendo cobrados pelo imposto mais alto.

Pode-se afirmar que o Código Tributário Nacional (CTN) delineia o imóvel rural a partir de exclusão do que é um imóvel urbano. Em suma, tratando-se de incidência (ou não) de IPTU, para ser considerado como propriedade urbana, o Código Tributário adotou a teoria da localização, devendo ocorrer a análise da localização geográfica presente ou projetada do imóvel, conforme estabelecido pela lei municipal.  E por exclusão, assim, instituiu que o ITR tem como fato gerador a propriedade localizada fora da zona urbana do município (art.29 do CTN).

A contrário sensu, o artigo 4º, inciso I do Estatuto da Terra (Lei 4.504/94), determinou ser necessária a análise da destinação do imóvel rural ou prédio rústico.  Isso posto, independentemente da localização do imóvel, para o Estatuto da Terra, configura-se imóvel rural ou rústico aquele que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial, mesmo que em zona urbana.

Havendo uma notória antinomia entre normas jurídicas, o Estatuto da Terra adota o critério da destinação (ou finalidade) para conceituar o imóvel como rural, enquanto o Código Tributário Nacional adota o critério da localidade. E, assim, os contribuintes têm sido cobrados de maneira indevida, em alguns casos, inclusive, ocorrendo a bitributação – quando dois entes tributantes cobram dois tributos sobre o mesmo fato gerador, nesse caso IPTU e ITR simultaneamente.

Nesse cenário incerto, há uma luz no fim do túnel para os contribuintes. Apesar de não expressar o melhor e mais perfeito entendimento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu a tese da destinação do imóvel para definir pela incidência do IPTU ou do ITR. Entretanto, impôs a necessária e indispensável comprovação da utilização da área para exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial.

Dessa maneira, o contribuinte que se enquadre nessas condições pode buscar o direito a substituir o IPTU pelo ITR, além de lutar pela restituição dos valores pagos a maior ao município nos últimos cinco anos.

Morgana Costa Cotias
Sócia do Nogueira Reis Advogados
morgana@nogueirareis.com.br